Jeferson Rocha – Ascom/CCSA
Denys Daniel tinha 15 anos quando ouviu falar da UFRN por meio de um projeto que iria envolver alunos da Escola Estadual Maria da Conceição Messias, em Jandaíra, região do Mato Grande Potiguar, e que mudaria sua vida para sempre: “Chegaram três pessoas da Universidade, fizeram uma reunião com a diretora e ela optou por fazer uma seleção de alunos do 1° e 2° anos do Ensino Médio e passou nas salas comunicando que ia ter um projeto para participar, por dois anos”, lembra.
Daniel participou da primeira edição do Projeto de Extensão “Intervivência Universitária”, coordenado pelo professor Washington José de Souza, do Departamento de Administração Pública e Gestão Social (DAPGS), do Centro de Ciências Sociais Aplicadas (CCSA), da UFRN, que já está em sua sexta edição, realizada de forma ininterrupta, pela Organização de Aprendizagens e Saberes em Iniciativas Solidárias (Oasis) com apoio de professores e alunos de diversas áreas da Universidade, além de voluntários.

O projeto integra a UFRN ao sistema público de educação básica por meio de uma ação de educação complementar, através da replicação de metodologia socioeducativa com oficinas, apresentações técnicas, debates e gincanas que abordam temas como Gestão de Políticas Públicas, Meio Ambiente, Saúde e Segurança Alimentar e Nutricional, Controle Geral e Participação, Economia Solidária e Associativismo e, nesta edição, a equipe está implantando atividades que envolvem a Educação Fiscal.
A ideia principal é complementar os conteúdos de forma dialogada: “Foi nas formações que a gente começou a aprender e a se tornar os cidadãos que somos hoje. As formações eram sobre responsabilidade social, políticas públicas, conteúdo social, temas muito novos que a gente não via na escola – conteúdos totalmente transversais mas que a gente não conhecia. E a gente teve total liberdade para opinar também, dava para notar que os professores eram bem abertos, dialogavam o tempo inteiro, não era uma coisa que eles passavam conhecimento, como é na escola, era uma coisa que eles chegavam e construíam, faziam círculos, dialogavam”, destaca Denys.

Além da formação, o projeto possibilita aos estudantes contato com o diversos ambientes para além de sua cidade, conhecendo outros lugares e espaços que ampliam o conhecimento de mundo deles, como a própria UFRN. “A gente tem encontros anuais em Natal, no Atheneu, e fazemos questão de trazê-los à Universidade para que tenham contato com a estrutura, não só a física, para que percebam o ambiente universitário. Dá para perceber o orgulho deles em estarem aqui neste ambiente público”, registra o professor Washington.
TRANSFORMANDO VIDAS
Antes de conhecer o projeto, Sara Bezerra, 17 anos, moradora de Galinhos, tinha dificuldade de se expressar e não via perspectiva do que fazer após concluir o ensino médio. “Eu acabei perdendo o medo de falar em público. Também conheci algumas áreas da UFRN e me apaixonei pela Agronomia, principalmente, porque sou filha de agricultor. Este ano, vou fazer o Enem e tentar uma vaga em Engenharia Agronômica, na UFRN”, relatou.
As ações da Intervivência acontecem de forma bianual reunindo cerca de 100 alunos de municípios diferentes em cada edição. Ao todo, o projeto já contou com a participação de cerca de 1000 crianças e jovens de escolas públicas de 12 cidades do interior potiguar, transformando a realidade dos municípios e vidas, como a do jovem Felipe Lima, hoje assessor técnico da Secretaria de Meio Ambiente do Município de Jandaíra
Ele entrou no Intervivência em 2016, durante o ensino médio, e encontrou no projeto motivação para seguir nos estudos e trabalhar para melhoria da sociedade. “Ao concluir o ensino médio, fui fazer uma graduação em Natal, e retornei para cá com meu trabalho, relacionando sempre tudo o que aprendi na Intervivência com meu serviço. Foi na extensão que aprendi sobre como elaborar projetos, o que ajuda na minha profissão e na vida – o aprendizado é para sempre.”, resume.
Daniel também é um exemplo de como a ação transforma vidas. Após participar, começou a se envolver mais nas decisões municipais, integrou grupos e movimentos sociais e se interessou por seguir os estudos e fazer uma graduação na UFRN. Concluiu o bacharelado em Saúde Coletiva e, com pouco tempo de entrada na Universidade, passou a fazer parte da organização da Intervivência. Atualmente, está como líder do projeto assessorando o coordenador, planejando as ações e monitorando os desempenhos e resultados. “Hoje, já penso em pós-graduação, já me preparo para tal, e isso porque vi os meus formadores como espelho e tenho oportunidade de ser espelho para os jovens da Intervivência”, avalia.
Os resultados talvez sejam difíceis de quantificar mas, segundo o professor Washington José de Souza, os relatos de que os participantes do projeto estão desenvolvendo ações sociais e papel de liderança nos municípios já o deixa gratificado. “A gente não tem controle de tudo que acontece na Intervivência, mas o carinho com o qual eles falam como egressos, muitos deles na liderança de movimentos sindicais de trabalhadores rurais ou que seguiram nos estudos e estão transformando suas vidas, nos possibilita, então, reconhecer que é um resultado fenomenal na vida dessa garotada”.
CONEXÕES
Ampliando as ações do projeto, em 2019, a equipe da Oasis agregou à Intervivência a realização de Feiras de Ciência em escolas públicas, especialmente durante a 16° Semana Nacional de Ciência e Tecnologia (SNCT), realizada no período de 21 e 27 de outubro, com o tema Bioeconomia: Diversidade e Riqueza para o Desenvolvimento Sustentável, tendo proposta aprovada em edital específico do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
A partir do tema central da SNCT, a Oasis abordou efeitos do sistema de produção e distribuição de energia eólica em municípios potiguares com base na questão Bioeconomia, Desenvolvimento e Sustentabilidade: Que ventos sopram e movem a energia eólica? em escolas municipais de Pureza, Galinhos e Jandaíra. Em novembro, as ações terão continuidade nos municípios de Japi (Escolas Municipais José da Costa Medeiros e Deputado José Marcilio de Medeiros Furtado e Creche Municipal Meninos Japinenes), no dia 29, e Pedra Grande, na comunidade de Enxu Queimado (Escola Municipal Professor Joaquim Faustino de Souza), no dia 14.
MEMÓRIA
O projeto de extensão Oasis de Intervivência Universitária surgiu em 2008 fomentado pelo edital conjunto entre o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), CNPq, CT-Agronegócio/ Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), nº. 23/2008. O Edital tinha o objetivo de possibilitar a jovens da agricultura familiar do interior o acesso à infraestrutura e a conhecimentos produzidos dentro das Instituições de Ensino Superior (IES).
A ação foi uma das 48 propostas aprovadas no país, sendo a única do Rio Grande do Norte: “A gente submeteu o projeto porque vimos a oportunidade de começar a inserir a Universidade dentro da educação básica, tão necessitada. Pensamos numa proposta para trabalhar com alunos da própria Escola Agrícola de Jundiaí, aprofundando determinados conhecimentos na parte de gestão, trazendo-os para o Campus Central para aproximar da parte da Gestão, da Administração Rural em virtude da minha atuação. Mas eis que depois de aprovado, o prefeito de Pedro Avelino, na época, sugeriu que a gente ampliasse a ideia. Então, inserimos prefeituras de um consórcio intermunicipal Mato Grande-Sertão Central – Afonso Bezerra, Galinhos, Jandaíra, Guamaré e Pedro Avelino – mantendo estudantes da EAJ.”, relata o professor Washington.
FUTURO
Jandaíra é o único município que participa do projeto desde sua primeira edição. Para Marina Dias, prefeita do município, essa parceria é fundamental. “É Importante para que nossos jovens percebam que, para além do universo do município, existe um mundo todo lá fora esperando por eles. É a Universidade quebrando essas barreiras, conhecendo de perto a realidade dessas pessoas, as vidas dessas crianças, desses adolescentes, mostrando para eles que é possível estudar numa escola do município, ingressar no Instituto Federal, ingressar numa Universidade Federal e depois retornar para cá.”, almeja.
Apesar do ânimo, com dez anos de existência do projeto e da ampliação de suas ações, o professor Washington vem percebendo uma redução no número de editais nos últimos anos e se preocupa com o futuro. “A gente precisa, necessariamente, ter um grupo bom de bolsistas e percebemos que está ficando difícil nos últimos anos. Conseguimos ter oito bolsistas este ano, mas para o próximo, se a gente começar a ter problema no número de bolsas, eu vejo que vamos ter muita dificuldade e talvez precisaremos adaptar o projeto para uma realidade enxuta, aqui mesmo em Natal – o que foge do escopo original de inserção de jovens da agricultura familiar.”, lamenta.
MAIS
Conheça mais sobre a Intervivência e outros projetos da Oasis nas redes sociais do projeto no Facebook e Instagram.
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