“Minha família era de artistas”, conta Noeli Vitorino sem esconder o orgulho das suas raízes, principalmente as femininas, as raízes das mulheres que a criaram – sua avó, mãe e tias – as que serviram de inspiração para o cuidado e afinco com que trata todas as coisas: sua arte, sua vida. Tem a dedicação em excesso tão evidente que ela chega aos que a cruzam, apenas porque o tempo as apresentou por um breve momento, com a mesma intensidade que chegaria a alguém que conheceu há 15 anos, por exemplo.
Noeli é potiguar, mas ainda criança foi morar em Teresina, Piauí, por causa do trabalho de seu pai no Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). “Papai sempre estava fora viajando e mainha cuidando dos meninos, chegou uma hora que não deu mais”, seu pai foi trabalhar no Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM) e com sua ida levou toda a família, os sete filhos e a esposa.
“Eu costumo dizer que a minha cultura mudou, minha educação também”, além dessas mudanças práticas com as quais rapidamente pôde se acostumar devido ao pequeno coração de criança, extremamente adaptável, este mesmo coração não foi capaz de enganá-la da saudade que sentia de sua avó.
Ainda em Teresina fez o curso técnico em estradas, durante o seu ensino médio na Escola Técnica Federal do Piauí (ETFP). Seu desejo era entrar imediatamente no mercado de trabalho, no entanto, o feito demorou um pouco mais do que ela gostaria. Depois da espera chegar ao fim, Noeli alcançou o reconhecimento fruto de seu empenho. Exerceu diferentes funções e chegou a receber convites de trabalho em várias instituições. Coloca sua intensidade máxima em tudo que faz, não há como passar despercebida.
Embora seu trabalho fosse produtivo e a doação de Noeli evidente, ela sentiu que sua vida necessitava de uma grande mudança, principalmente por causa de momentos difíceis no âmbito pessoal. As ruas e cores de sua cidade já não cabiam mais na mulher que precisava ser renovada em Noeli.
Foi nessa tempestade que ocorreu a mudança para Natal. Em 2010, seu irmão, que já morava na cidade, a avisou de um concurso para a Universidade Federal do Rio Grande do Norte que estava com inscrições abertas.
Quando trabalhou em Teresina, na prefeitura da cidade, existiu um projeto de lei de incentivo à graduação, Noeli fez o curso de Secretariado Executivo, o mundo dela se abriu a partir da oportunidade de ter agarrado este objetivo. O concurso da UFRN se encontrou com este passado, como um casamento perfeito, como se os acontecimentos estivessem ligados desde o princípio.
Sempre gostou de trabalhar com público, cercada por outras pessoas. Uma das suas dificuldades iniciais foi ter estado por um período sozinha, numa sala em que ouvia a sua respiração. Por sorte, aos poucos novos rostos foram chegando, um alívio para a sorridente Noeli.
VIDA E ARTE
Desde o curso de Estradas já gostava de desenhar, “pintar com o lápis de cor”, sem na época ter dimensão da quantidade de canetinhas e lápis que teria no futuro, fazia seus desenhos e projetos.
Durante os anos que passou em Teresina teve a oportunidade de fazer um curso de desenho artístico, e em Natal, fez um curso de pintura com aquarela no Núcleo de Arte e Cultura da UFRN. Foi ainda presenteada com um livro, por um amigo, e redescobriu a arte de escrever – a caligrafia de Noeli pode facilmente ser confundida com a de uma máquina impressora, tamanha a semelhança e perfeição com que consegue diferenciar fontes e letras na escrita.
O bordado e a música sempre estiveram presentes em sua vida, “minha mãe bordava, minhas tias cantavam em coral de igreja, elas tinham as vozes lindas e eu ficava só admirando”, mesmo nenhuma delas tendo seguido carreira. Noeli relata a precisão com que realizavam seus afazeres: “ quando elas estavam fazendo esse trabalho, eram perfeitas. Eu não sou perfeita, sou perfeccionista, então eu acho as minhas tias fantásticas”.
A música tem uma força tão grande em sua vida que até em seu trabalho consegue fazê-la permanecer como algo natural, junto a alguns colegas deram início a um coral formado por servidores. O Grupo se reúne semanalmente para ensaios e se apresentam quando há alguma programação especial no CCSA, ou a convite em outras instituições. Quando não estiver trabalhando, bordando ou pintando, talvez Noeli esteja apenas inventando coisas novas em sua imaginação criativa, pois é quase impossível não encontrar uma artista ao dar de cara com ela andando pelos corredores.
“Eu costumo dizer que ter morado com a minha avó me despertou para o amor, me despertou para a arte, foi uma experiência maravilhosa, tudo veio do que eu vi na família”. Noeli certamente é uma raridade, sua vida não é uma cópia de seus antepassados, mas mesmo que fosse, o mundo seria um lugar mais animado com outras pessoas de humor tão leve quanto o dela.
Uma das suas palavras preferidas é “alegria”, Noeli a personifica sem nem perceber, provavelmente porque está ocupada demais amando o mundo e todas as coisas que o formam. Seja escrevendo, pintando ou presenteando as pessoas, o que ela está de fato fazendo é permitindo esta alegria transbordar em forma de afeto.
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